Laura Assis nasceu me Juiz de Fora, Minas Gerais, em 1985. Poeta, tradutora, editora e professora, com doutorado em Literatura pela PUC-Rio. É autora do livro Depois de rasgar os mapas (2014) e de três plaquetes de poesia, além de textos literários e críticos publicados em veículos diversos. Integra o coletivo editorial Capiranhas do Parahybuna, edita a revista ADobra e dá aulas de Língua Portuguesa e Literatura no CAp. João XXIII/UFJF.
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Eu sou neta de dois ferroviários
e não me lembro qual deles me contou
que estatísticas e testemunhas mostram
que casos de atropelamento nos trilhos do trem
quase nunca são propriamente acidentes.
As empresas até tratam como se fosse,
assim como a imprensa, mas a verdade
é que não há como não ver o trem,
não escutar o barulho dele chegando,
não sentir o chão tremer,
não enxergar a cancela baixando
ou não ouvir, mesmo que nos últimos segundos,
o escândalos da buzina, e que portanto
alguém só vai parar na frente
de um trem em movimento
se assim o quiser e decidir.
EQUINÓCIO
essa sua metade
que segue na sombra
e se esconde
das fotografias
não se revela
por quase nada
mesmo no breve instante
em que o resto brilha
de uma outra parte
também é memória
o que foi iluminado
e ainda assim se perdeu
hoje falamos dela
com o mesmo cuidado
de quem diante
de estranhos não diz
o verdadeiro nome
de um deus
ENTROPIA
você se lembra da primeira vez
que contou sua história e soube
dali pra frente a resposta
do mundo seria:
SPACE SONG
foi quando eu percebi que o azul
esse azul
que se desloca aí de dentro
poderia ser de outra cor
você sentada à mesa
não importa a fala
outro argumento
te entrego um objeto
qualquer para que
assim você
me escute
existe também esse espaço
outro espaço
de onde decolam as palavras
e efeitos a língua
nem sempre é legível
e eu me perco como se
você se levante e só depois
quando entendo a lógica
do seu corte a sua vontade
você me ensina que até
para observar nuvens
é necessário encontrar
um método e só depois disso
seremos livres
para sobrevoar nosso desejo
a uma altura possível
possível mas nunca
nunca e isso é muito importante
possível mas nunca
perto demais
*Poemas do livro “Parkour”, Edições Macondo, 2022.