Jean Baudrillard nasceu em Reims, na França, a 27 de julho de 1929. Considerado um dos mais importantes e polêmicos intelectuais franceses, foi sociólogo e filósofo, além de fotógrafo e poeta. Extremamente reservado, sua biografia é de difícil acesso, porém, suas obras, reverberam cada vez mais, principalmente em campos acadêmicos. Baudrillard desenvolveu uma série de teorias que remetem ao estudo dos impactos da comunicação e das mídias na sociedade. Partindo do princípio de uma realidade construída (“hiper-realidade”), o autor discute a estrutura do processo em que a cultura de massa produz esta realidade virtual, contradizendo os discursos da “verdade absoluta” que contribuem para o questionamento da situação de dominação imposta pelos sistemas de signos.
Por esses preceitos, Baudrillard passou a ser forte inspiração de vários artistas e pensadores que abordam temas sobre a relação entre ilusão e realidade. Na trilogia Matrix, por exemplo, produzida pelas irmãs Wachowski, o personagem Neo (Keanu Reeves), vive um hacker que guardava seus programas de paraísos artificiais no fundo falso do livro “Simulacros e Simulação”, escrito por Baudrillard. Apesar disso, o filósofo confessou, na época, não ter gostado do filme, dizendo que elas não entenderam a sua obra.
Jean Baudrillard faleceu em 2007, aos 77 anos, em Paris, na França.
I
Se fora de cena cai
dizendo
a vertical
de amigos dessemelhantes e que
foram escolhidos o gavião
adormecido que voava
concentricamente
próximo a uma ordem
no cume do Sol
à mercê do Sol
e à espreita, sem olhos,
da consciência,
sobre esta fogueira persa,
as Taillades – ou
se à indocilidade
se deve reiniciar,
é que desditos, desunidos, e
sem poder nos separar –
um chegado a tempo
ao estado segundo, o outro
mantendo um limite
singular –
o equilíbrio já não está em nós
como para quem o quer,
é que a sede voltou
a questionar a paciência.
Ora, o que não mais queremos
não há de mudar
e nos deixará sozinhos
obsedando-nos.
IV
A água é tão clara
que aceita o jorro
dos bichos.
Tudo é exato
ou avivado
em cena
não longe da compreensão humana
ou sob a foice
sob a cinza
sob as águas-mães.
Os músculos estriados
inervam o chão
revirado. Até a água
tem a inervação
de teor do mal.
E nada é separado.
Tudo é exato como
o sangue sob as unhas.
Assim se alternam
as coisas imaginadas
que circundam seu
próprio vazio, onde reluz
imersa como
cadeira a espada
gestual do
Sol.
VIII
Em cena ou
sob paredes violentamente
iluminadas
mas contidas
e preservadas,
sem nunca tocar o chão
peripécia animal – leveza
peripécia mental – a dança
e as batalhas
nem vitória nem derrota,
a guerra é isso,
e as espirais dos ladrilhos
são essas
de todo jeito – mas
fogem por baixo delas como
um sonho alternativo
cursivo ou discursivo
as linhas de fuga
as superfícies planas
a carne crua, se balança
entre lanternas gêmeas.
E a luz é tão fria
que distingue vinho
e água
num só copo.
São as andorinhas que
voltam de onde vêm.
E o fogo se apaga lentamente
como um fogo que
se apagasse lentamente.
IX
A voz também
muda de céu.
Os pássaros ultrapassam
quem os vê, os mais velozes.
É uma inovação de nosso sono.
Ausentes, somos como
a voz na afonia
ou a casa vazia
entre a música surda
e os estilhaços de vidro –
paredes nuas sem fé nem
nada senão os azulejos de faiança
em vez de carne –
desabitadas, mas
a relva é macia
na engrenagem das coxas, e mais
que o tempo e o espaço
separa-nos
a anomalia das joias mecânicas
até uma cama de ferro
em pleno campo
desativada
ou lá no céu
o vento gelado –
claramente agora
as paredes estão em pé
sua sombra prolonga
quem nelas pensa.
XII
Amarga
nas mãos enluvadas
a luz artificial
o Norte
mas um grito único, a infância
parece garganta nua
o Oriente
a sede e
a satisfação da sede
o calor inteiro
a aberração das forças
o meio-dia do verão –
mesmo vazia a cena conserva
uma saída possível –
no entanto interna é
a falível
sem pensar, e o vento
doce, rente às paredes,
a si mesmo – elasticidade
como por um vidro escuro
desafinado
ou trôpego
o Ocidente
brinquem gritem
nossas unhas são tão grandes
que os quatro cantos do céu
grudam nelas como terra
cavada – e
nem chão nem céu, mas quis
o sol de fora
não só os gestos são
calculados, as próprias mãos
têm ciúmes
uma da outra.
*Poemas do livro “O Anjo de Estuque”, Editora Sulina, 2004.
Traduções de Cristina Abruzzini Werneck Lacerda e Adalgisa Campos da Silva