Samuel Taylor Coleridge, mais conhecido como S. T. Coleridge, nasceu em Ottery St. Mary, na Inglaterra, a 21 de outubro de 1772. Foi poeta, crítico e ensaísta, considerado, ao lado de seu colega William Wordsworth, um dos fundadores do romantismo inglês. Influenciou toda uma geração de novos escritores britânicos, como Thomas de Quincey, Lord Byron e P.B. Shelley. Também ficou reconhecido como um poeta revolucionário, engajado a fundar uma sociedade utópica denominada de “Pantisocracia”. Em 1792, ganhou um prêmio, da Sociedade Real de Literatura, por uma ode em protesto contra o tráfico de escravos. Um de seus poemas mais conhecidos, “A Balada do Velho Marinheiro”, foi adaptada pela banda Iron Maiden, para faixa de encerramento do álbum Powerslave, de 1984.

S. T. Coleridge faleceu aos 61 anos, no dia 25 de julho de 1834, em Highgate, Middlesex, Inglaterra.

 

AS DORES DO SONO

Antes de no meu leito repousar,
Não tem sido meu hábito rezar
Movendo os lábios em genuflexão;
Mas em silêncio, sem afobação,
Disponho o espírito ao Amor aberto,
Na humilde fé as pálpebras aperto,
E com reverencial resignação
Nenhum desejo ou pensamento expresso –
Somente um senso de suplicação;
E, apesar das fraquezas que confesso,
N’Alma um senso de bênção fica impresso,
Pois sinto dentro, em volta, em tudo mais,
Saber e Força que são eternais.

Ontem à noite, entanto, rezei alto
Com angústia e agonia – uma tortura! –
Sob as formas e idéias em assalto
De multidão diabólica e perjura:
Lúrida luz, tirânica coorte,
Senso de culpa sem qualquer suporte,
E só o que desprezo, sempre forte!
Quer vingança a vontade ineficaz,
Ainda frustrada, e ainda a arder em paz!
Às repulsas misturam-se os anseios,
Fixados em objetos rudes, feios!
Fantásticas paixões! Louco furor!
Tudo no opróbrio, tudo no terror!
Expunha ações que eu ocultar devia,
Sem distinguir sequer, de tão confuso,
Se era eu que as praticava ou as sofria,
Pois tudo era remorso, dor, abuso;
E, meus ou de outros, eis na minha lida
O pejo que à alma afoga, o horror que afoga a vida.
E assim duas noites: e a melancolia
Com seu torpor contaminava o dia.
O sono, larga bênção, era então
A desgraça maior da disfunção.
Dei, na terceira noite, horrendo grito
Que me acordou desse íncubo maldito,
E, em estranha e cruel desesperança,
Chorei como se fosse uma criança;
E tendo assim com pranto conduzido
A minha angústia a um grau menos dorido –
Tal castigo – disse eu – fora adequado
A uma alma mais manchada de pecado,
Que turbilhona sem cessar o centro
Do inferno imensurável que tem dentro;
Que ao contemplar o horror das ações más,
Sabe e abomina, mas deseja e faz!
Essas dores convêm a uma alma assim;
Mas por que, mas por que caem sobre mim?
Ser amado é-me a só necessidade,
E quem eu amo, eu amo de verdade.

APARIÇÃO

Todo aspecto terreno e semelhança,
Tudo o que do nascer trouxe de herança,
Passou. Em sua face iluminada
Não existe nenhum sinal de nada
Germinando onde a pedra se fendeu…
O que se vê é um espírito só seu –
Pois é ela, ela própria, ela somente,
Brilhando no seu corpo transparente.

SOBRE A POESIA DE DONNE

Com Donne, que em dromedário faz trotar a musa,
Atiçador de ferro em “nó do amor” se encruza;
Dédalo é a fantasia, a rima é atleta coxo,
O engenho é fogo e fole, a idéia é prensa e arrocho.

EPITÁFIO

Pára, filho de Deus! Detém-se, bom cristão,
E piedoso vem ler. Um poeta, ou o que
Parecia ser ele, jaz neste torrão.
Ergue uma prece pelo pobre S. T. C.,
Afim de que ele, que na luta contra a sorte
Encontrou na morte em vida, encontre vida em morte
Não glória – graça; fama não – mercê porém,
A Cristo suplicou. – Assim faças também!

*Poemas do livro “S.T. Coleridges Poemas e excertos da Biografia literária”, Editora Nova Alexandria, 1995.
Tradução de Paulo Vizioli