Javier Corcobado nasceu em Frankfurt, Alemanha, no dia 30 de julho de 1963. Filho de imigrantes espanhóis, foi  criado e vive em Madrid, onde iniciou sua trajetória artística na década de oitenta. Poeta, músico e compositor, fez parte diversas bandas, como o “429 Engaños” e o “Demonios tus ojos”. Suas obras são caracterizadas pelas experimentações linguísticas e toques vanguardistas, abordando temas da rotina, com teores pornográficos, escrachados e melancólicos.

UM POUCO DE ÓDIO

Uma punhalada na cara
mais bonita de uma revista pornô,
uma olhada no espelho
e um gesto exagerado.

Tenciono o bíceps direito
e desço as escadas com um pé.
Olho a chuva cair sobre os carros
e em alguns dos 6 milhões
de filhos da puta
que povoam este satélite da lua.

ÓLEO FERVENDO

Sonha como o cantar
de um dos 40 ladrões
quando o óleo fervendo
fica de joelho
dentro de sua jarra na tumba.

Assim é a música
desta festa divertida.
Não era divertido, irmão,
sobras, intoxicou-se
com maçãs podres.
Dança tua febre,
amarra teus cabelos no trem.

Sonha com um coração
perdido dentro de um relógio
calado por uma bala
na manhã do grande despertar.

Teus joelhos serão teus pés
e virá suplicar.
Minha xícara espirrará em teus olhos
e você chamará a gritos
a escuridão.

INSULTO ÍNFIMO

Carros, moedas,
corações atravessados por dinheiro,
falsas franjas no amor desta roda,
da capela de superfície,
das drogas de descarga,
da coragem da ilusão.
Preguiça.

Uma brisa fresca
me cerca à balada
do pastor assassino
de seu próprio rebanho.
Navegando, navegando
enquanto nado no labiríntico lago
do meu duodeno.

PRAZER

Prazer por não ter o prazer
de tocar a cruz de meus lábios.
Prazer por não ter o prazer
de violar meu próprio amor.
Prazer por não ter o prazer
de fincar suas garras em minha garganta.
Um trago e um mundo que não pesa
no prazer confuso.
Um chapéu tóxico.
Afogar-se de sede.
Fome de não ter fome.

HOJE NÃO MAMAS

Hoje está granizando
a infância sequestrada
para ferirmos a todos
e acabar de uma vez
com nossas linhas quebradas,
estrada procedente
da uretra de Deus
jubilado.

Hoje as tripas dos cerdos
estão cheias das centenas
de pássaros voando,
e só há um no céu
escapando.
Xarope no cu
porque as serras mecânicas
entram por teus calcanhares.

Hoje não cantas,
Hoje não choras,
Hoje não mamas.

VAGABUNDO

Levo anos buscando
o lenço que você limpou meu beijo.
De papel, com o selo de teus lábios vermelhos,
é isso.

*Poemas do livro “Eu queria ser um cachorro – Poesia Completa (1991-2007)”, El Gaviero Ediciones, 2007.
Tradução de Igor Calazans para o Recanto do Poeta.