Nathan Yonathan nasceu em Nathan Klein, Ucrânia, no dia 20 de setembro de 1923. Imigrado com sua família para o Mandato da Palestina, em 1925, é considerado um dos principais poetas israelenses do Século XX.  Seus poemas foram traduzidos do hebraico e publicados em mais de uma dúzia de idiomas, entre eles: árabe, búlgaro, chinês, holandês, inglês, francês, alemão, português, russo, espanhol, vietnamita e iídiche. Ele se formou em Literatura Hebraica e Literatura Comparada pela Universidade Hebraica de Jerusalém, Universidade de Tel Aviv e Universidade de Oxford. Ele deu palestras internacionalmente, bem como dentro do sistema escolar público israelense. Um dos mais eminentes professores de escrita criativa de Israel, ele era conhecido por seu espírito generoso e desejo de promover novos talentos poéticos. Enquanto atuava como Editor-Chefe de longa data da editora Sifriat Poalim, ele também foi eleito por unanimidade Presidente da União dos Escritores Hebraicos e representou Israel em conferências literárias ao redor do mundo. Natán Yonatán faleceu no dia 12 de março de 2004, em Petah Tikva, Israel.


SABE POR QUÊ ESTOU CANSADO?

Você sabe por quê já estou cansado?
No princípio, por levantar ao amanhecer
e galopar a uma velocidade proibida.
Depois por retornar tarde
e me pôr a pensar sobre a vida, sobre o tempo.
Também te acontece ouvir ranger a máquina do corpo
como se fosse a música de um réquiem
que transmite à alma tão ansiosa
a oração onde se fecham as portas do poema.
O museu espera em silêncio.
O cemitério, sem amigos, apenas,
salvo este velho porteiro que não leu uma página na vida.
O mais justo dos homens
espera um lugar recolhido.
Também a ele dói ver os poetas
permanecerem calados depois de seus silêncios.

JORGE LUIS ENVELHECENDO

Ele também envelheceu. O último cavalheiro
perambula pelo prado das memórias
com os olhos fechados
por amor ao árido pampa de suas nostalgias.
Já distante do mar que amou, no silêncio da Biblioteca
coleciona restos de adagas oxidadas
e relatos de ficção sobre orgulhos e pecados,
se consola talvez com o delírio de seu amigo,
o bom Alonso Quijano.
Desenha sobre a cerca de sua própria cegueira
uma triste silhueta sobre a máquina de escrever
para salvar uma lenda dos gaúchos,
últimos fidalgos do amor sobre a terra
que galopam montados na nave espacial de seus sonhos
sobre a terra grávida de sangue
dos tipos humanos mais bonitos.
Jorge Luis, esse velho de Buenos Aires
que deixou de herança aos cegos
os olhos,
a noite,
e os livros.

VARIAÇÕES DO OUTONO

São os sintomas mais conhecidos:
de novo baixa a tensão arterial, e o vento
sopra frio, a cor das nuvens, folhas
que sobrevoam o jardim,
arbustos calcinados a quem não perdoou o verão,
corvos vestidos de negro e um campo podado rasante.
Um reino de breves dias que transcorre imortal
como o florescer posterior dos muros de pedra.
O tempo novamente ensaia suas estações:
agora o verão juntou-se com seus ancestrais:
se o triste manto de folhas é quimera,
conceda pelo menos permanecer como poemas
na magia de sua solidão,
derrama essa luz outonal que empresta o vinho à alma,
talvez tocar um réquiem, entre o glorioso e o melancólico,
sobre as cordas do coração.
Parece que isto quer brindar algum alívio,
demonstrar que a pena também é coisa passageira:
a terra segue sobre seu eixo, os astros por sua senda,
a casa está esperando,
poderá chegar até ela, desleixo dos ombros,
cansado, até encontrar algum consolo.

HÁ FLORES

Diga-me: Viu a formosura
que vibrou no ar de outono?
O campo dourado se extingue até o negrume
acendendo as velas da torre albarrã.

Diga-me: Viu como o púrpuro
lançou seu grito para as distâncias?
Um campo sangrento era em sua época
e hoje é um campo de papoulas.

Não arranque nada, filho meu, não arranque,
que são flores passageiras.
Flores que daqui em diante sempre
sobrevivem na música

Viu ali o que se torna negro?
É campo de ortigas, meu menino,
todo o verão abandonado
e agora é campo de lavoura.

Viu ali o que se torna branco?
Meu menino, é campo dos prantos,
e suas lágrimas viraram pedra
e as pedras choraram flores.

Não arranque nada, menino, não arranque
que são flores passageiras.
E as flores que daqui em diante
estarão conosco.

*Poemas do livro “Apostar al Tiempo”, Visor Libros, 2004.
Tradução de Igor Calazans para o Recanto do Poeta.