Franklin Alves Dassie nasceu em Niterói, Rio de Janeiro. Poeta e Professor Adjunto de Teoria da Literatura na UFF, possui graduação em Português/Literaturas pela Universidade Federal Fluminense (2004), Mestrado em Letras pela Universidade Federal Fluminense (2007) e Doutorado em Literatura Comparada (2011) na mesma universidade. É pesquisador do Grupo de Pesquisa “Relações entre Literatura, Filosofia e Psicanálise na contemporaneidade” (LIFIPs) e do Grupo de Pesquisa “Estudos Contemporâneos da Tradução”, atuando principalmente com as relações entre poesia, teatro, cinema, política e tradução. Nesse sentido, publicou artigos sobre essas relações em Waly Salomão, Yoko Ono, na prática fotográfica de Robert Frank, entre outros. Faz parte do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Literatura da UFF. Publicou, dentro da coleção Ciranda de Poesia, da Editora UERJ, o volume dedicado à obra de Sebastião Uchoa Leite. É colaborador de alguns jornais e revistas, escrevendo sobre literatura e poesia moderna e contemporânea.
Grande hospital
Há um grande hospital
com leitos que talvez sejam uma saída
para tudo isso
que vivo
que escrevo
que minto
Um mundo sem cápsulas
um mundo que seja mundo
A realidade cortada com um bisturi
aparece na minha frente
me espanto
me espanto
me espanto
seja onde for
longe desse mundo
Like a rolling stone
Eu é alguém fora do corpo
Eu é alguém que canta longe uma canção
Como você se sente?
Eu é alguém que canta longe uma canção
Eu sou eu
possuído por um delirante desejo de não falar nada
delirante desejo
que cada cápsula
proporciona
mas o preço é uma vida
Eu é alguém que está possuído por um desejo
de mudar de leito
Eu escuta uma canção de longe
uma voz
que não a dele
Como você se sente
seja onde for
longe desse mundo?
Não pise na grama
Tudo que estava dentro
caiu na grama
com a ventania
– uma conferência sobre escrever
um dicionário de notas
vinte e três fantasmas
quarenta e cinco anos de trabalho –
mas ele
numa paciência zen
recolheu tudo
– uma conferência sobre escrever
um dicionário de notas
vinte e três fantasmas
quarenta e cinco anos de trabalho –
Assim vamos vivendo
recolhendo
aqui e ali
documentos perdidos
talvez não com a paciência zen
mas com um esforço
sisífico
de rolar pedra acima
pedra abaixo
pedra acima
pedra abaixo
Pista escorregadia
Um fantasma
é o vento que espalha tudo
mistura lembranças
faz-nos perder a paciência
– um fantasma é
uma conferência sobre escrever
um dicionário de notas
vinte e três espasmos
quarenta e cinco anos de trabalho –
O mundo entra sempre
e faz o que quiser
conosco
– troca tudo de lugar
atrapalha nossas convicções
– um fantasma a cabeça perdida
vinte e cinco cápsulas
uma ventania
duas luvas num porta-malas
Reclamamos
e mesmo assim
não perdemos a vontade
de viver
Pós-escrito
Quando consultamos os documentos
da revolução
somos tomados por um gosto
pela mudança
acreditando que há saída
para regimes fascistas
para governantes paranoicos
para uma sociedade fora do prumo
para um mundo melhor
sem tantos demônios
sem tantos demônios
sem tantos demônios
*Poemas do livro “grande hospital”, Editora Sete Letras, 2021.