Mauro Segarra Martins Paes nasceu em São Paulo, no dia 17 de janeiro de 1971. Poeta e escritor, formou-se em engenharia elétrica e morou na Alemanha para um estágio de 6 meses entre 1999 e 2000. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 2008, onde se casou e vive até hoje. Em 2018, ficou entre os finalistas da modalidade “Poesia do concurso Segunda Maratona Literária”, promovido pela Editora Oito e Meia pelo site “Carreira Literária”.

ÂNCORA

De que serve o vento
que traz para cá
tanto abutre,
se é para acabar atracado
em tal deque?

Uma âncora é um sorriso amarelo
que se iça no mancal
de um coração oco de amor
e coragem
por corrente de elos precários,
qual isca que não pesca do mar
mais do que bota.

CANTOS VIVOS

Tentáculos tentam desembaraço
de não alcançar
os espaços recônditos
de juntas porcas,
em tantas dobras, rebarbas,
cegas arestas e frestas,
no que resta das sobras
da gula de ângulos,
sobre quinas e galos.

Cantos vivos em qualquer escala,
solos de peitos abertos,
tema em preto e branco
que se sabe de cor.

ESPANTALHO

Já faz um tempo tamanho
nem sei bem precisar
o quanto é meu este campo,
parte do meu domínio.

Mas se tenho esta propriedade
de dissimulação e disfarce,
sei que para me manter
neste terreno inóspito,
só cara feia não bastam
e socar o ar é estéril,
ou me desmancho no vento
e os corvos vêm comer na minha mão.

RALOS

Ainda que desagrade o sermão,
não agrida o seu irmão
e agradeçamos

a grade em aço e cimento
emoldurando esse mundo,

os grãos de amargas estrelas
de que mascamos ao sumo,

o grude das nossas almas
às armações das ossadas,

tão magras, mas, mesmo assim,
amordaçantes masmorras,

tais grandes mantas de arame
moendo as nossas essências,

pelo ralo nosso de cada dia,
pois ralar é nossa sina,
porque ralados
à matéria pó retornaremos,
em insólitos dutos, diluídos,
e, a cada turno, mais ralos

mas ralos, mas tão ralos,
até que possamos passar
pelo ralo.

*Poemas do livro “Lamento Elementar”, editora mondrongo, 2023.