José Mateos nasceu em  Jerez de la Frontera, Espanha, a 22 de agosto de 1963. Poeta, escritor, pintor e editor, é uma das principais referências da chamada “Geração 90”, da poesia espanhola. Foi premiado com o Prêmio Internacional Torino in Sintesi, em 2019. De acordo com a crítica, a sua obra é uma das mais profundas da atualidade. Atualmente ele dirige a casa editorial “Canto y Cuento”.

PERGUNTAS PARA UMA SOMBRA

Deixa-me que te veja cara a cara.
Quero saber. Não é muito o que peço.
Saber se você era semente ou apenas esquecimento,
e se ao entrar em ti tudo se aclara.

Quero saber o seu fundo, onde para
a alma, quando você chega sem ruído,
porque existe a dor e qual sentido
tem esta noite lenta, lenta e rara.

Você que cobre o sol e na primavera
da lama faz brotar a rosa esquiva,
Sombra irmã, diga-me, quando eu morrer

o que encontrarei. Mas deixe-me viver.
Ou quebra-me se não; ponha-me ao seu lado
traga um pouco de cal definitiva.

CANÇÃO I

Todavia quase um menino
e você se sentou para esperar
às margens do grande silêncio.

Você pensava que estando sozinha
com sua voz quiçá você poderia
roubar do mar o seu segredo.

Se te foi a juventude.
Mudos passarão os anos
e agora você está oco por dentro.

Você poderia, se ao fim soar
do grande silêncio o acorde,
chegar a cantar o seu eco?

CANÇÃO 12

I
(Antes)

Não quero dormir. Escrevo
e sonho com o que me traz.
– livre este túnel cego –
o fio de uma esperança.

Deixo uma vela acendida
e a janela entreaberta,
para que você pudesse voltar
hoje, da morte, para tua casa.

II

(Anos depois)

Você já está confortável na morte?
Já me deixa que te esqueça?
Você também está saindo dessa ausência
onde sonhei que você ainda existe?

CANÇÃO 13

Estar morto é estar distante,
entrar na noite aberta
e, às perguntas dos outros,
ser a resposta secreta.

*

Um dia, você atrás desse muro,
o que recebe da terra
quanto há de ser? Tudo ou nada?
A pele caída e inútil
ou a batida de umas asas?

CANÇÃO 15

(Um mal despertar)

Muito lenta, ao anoitecer,
você entrou para ver os meus segredos…

Alma, de onde você veio?
das profundezas do que sonho
você volta fria e assustada?
O que você viu lá dentro?

*Poemas do livro “Canções”, Pre-Textos Poesia, 2000.
Tradução de Igor Calazans para o Recanto do Poeta.