Aristides Ledesma Alonso, nascido a 26 de abril, em Iguatemi, Mato Grosso Do Sul, é Poeta e Professor graduado em Letras (1974) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Faz parte do grupo NovaMente e UniverCidade de Deus, tendo a maioria de seus trabalhos publicados sobre os temas transversais ao revirão, à transformática e a nova psicanálise fundada por MD Magno. Suas pesquisas estão voltadas, principalmente, para a questão das novas tecnologias e da psicanálise, sendo coordenador do projeto de pesquisa “A Galáxia de Freud” e do projeto de extensão “Tecnologias da Mente”.
BEIJO
Perco a vida, perco o tempo.
Te amo nessa perdição dos atos,
Alma perdida como uma ferida
A latejar fora de ti.
Te amo de um ódio transparente,
Uma dor de dente sem cura,
Gozo transpirante e pasmo,
Como se morresse do que já morri.
Mordo minha língua na sombra de tua boca,
Mordo meus lábios na ausência de tua carnação
E te beijo e me beijo e te bato
Nos intervalos do desencontro me mato
E dou por mim em ti
Na miragem do espelho do que já vivi
Perco a vida, perco o tempo.
Sou uma cicatriz na ponta de teu nariz.
PRISÃO
Apesar da minha raiva contra ti,
Você que sustenta as barreiras do limite,
Sinto-me preso e escravo desse entrave
E arco com a cara e a coragem
Do medo de me ultrapassar
Sem nunca te encontrar neste mato
Sem cachorro.
Vivo do limite de viver a morte
E morro o limite de ver a vida
Morta e renascida do teu ser
Percorrendo a tua superfície apenas
Sem te penetrar ou sair
Desta armadilha viva e que caí
No momento em que me tornei só
Sintoma de tua imensa realidade.
ALBA-TROZ
Vim a saber de mim
Pelos teus olhos.
Mim mímico me vi, rei,
Re-visto além, alhures, em ti, ouvi,
Já na prisão do espelho, palhaço refletido.
Sonhada como um anjo sem cabeça
A minha imagem se projetou de mim
E minha carne do’eu dessa ferida!
Essa ferida ferina doída,
Doída, dó ida,
Se converteu em ferida feminina.
E agora esse emblema me mata,
Bela atriz,
Miragem branca do meu caminho cego,
Que longe de mim peregrina.
AVESSO
O nojo é esse jogo de espelhos
Quando te amo em vômitos de olhar
E temo a perda irrecuperável de mim
Como uma amputação pré-sonhada.
Não! o meu silêncio já é compreensão…
O nojo de te amar agora
Quando um luto te vejo
Cosendo os cacos do espelho quebrado
São meus olhos cheios de tua imagem
E vazios de ti
Sendo vistos pelo avesso
Numa edição futuramente sonhada
E passada do dia em que me perdi
No silêncio que atravesso.
FIGURA
Eu sou: menos eu,
Transparência de vidro;
Aqui e lá a máscara
A debater-se no olvido.
Eu sou mais ou menos eu
Em permanência que se toma
Ora se fosse o fóssil da morte
Virando areia entre meus dedos.
Eu sou mar menos d’eus
Na perdição serena do teu r’astro
Que bebo na constelação das palavras:
Eu sou a dissonância amorosa e dissoluta
Da harmonia real.
ESTÓRIA
Converso com a chuva infantil
Do meu cinema solitário.
Caminho por entre as gotas afiadas do tempo
Fumando o cigarro horizontal da palavra não.
Desapareço em mim na afonia do pseudo-silêncio
E gasto as horas nunca repetidas no amanhã já sido.
A preoculpação do homem é cansativa
E tem cheiro de isopor o medo da solidão.
As esquinas da cidade secretariam anseios, só olhos
E os bares fazem a maquiagem crepuscular do desconhecido
Só agora percebo o acidente do ritmo vivido
E o encanto de restar e ser ao nada, traído.
*Poemas do livro “Cruzficção”, Taurus-Timbre Editora, 1989.