Bianca Gonçalves nasceu em São Paulo (SP), no ano de 1992. Poeta, pesquisadora, professora e revisora, faz mestrado em Letras na USP. Publicou os livros de poemas “Como se pesassem mil atlânticos” (Urutau, 2019) e “Quadril & Queda”(Círculo de Poemas, 2024). Escreve crônicas e ensaios no blog “Bianca não é branca”.
Junguiana
Depois que me lançaram à cova,
esperei por leões, tigres-de-bengala,
uma matilha abestada.
Mas vieram homens mezzo calvos,
mezzo cabeludos, na faixa dos cinquenta,
com relógios de pulso dourados e uma colocação
em gabinete público no interior
do estado de São Paulo.
Sistema de som
aqui a gente aprende
tudo junto, no fervo, coletivo
a dois: reggae é dança de
salão
são luís, lá de cima, abençoa
a DJ do outro lado, outro
santo, são paulo
sou dessas que faz
o impossível num
inverno: um cropped e
meu umbigo em
sacrifício.
Jornada da heroína
eu e minhas
amigas de calça
jeans e top
preto. fico no
meio pois meu
cabelo é
vermelho.
mando um bip pro
boy. me entupo de
chá preto – não bebo
– mas danço bem.
pique olha, não
mexe só que sem
chefe e ninguém se
faz de príncipe e
muito menos de
rei.
mas não sou trouxa e
também quero ficar de
boa, por cima, e,
leonina, aproveito
a batida na hora que
a MC cantar:
. não sou mais menina
Imitatio
imitar diligentemente as
poetas do século passado
poderia me garantir uma
vaga naquele estágio?
Monogamia
essa economia de afetos custa
mas nem por isso demando a
tradição.
ser exclusiva também tem seu
preço:
ontem mesmo vi seus amigos
na quadra jogando
pelada
descanso na sala com
os pés pra cima
e
como me dói a cabeça!
Perreo
eu confundi os bailes e
fiz um quadradinho na festa dos
refugiados
tirei a mala suerte quando
por acidente fiz um
comentário muito ácido
un taco muy caliente
que pedi como se
proficiente fosse
entro nas artes
do perreo antes das
onze
troco olhares, bato mi pelo
por mais perra que fosse
não sou aquela
que vive na rua, que ele
afaga, dá gole de breja,
uma calabresa:
a vira-lata caramelada.
*Poemas do livro “Quadril & Queda”, Círculo de Poemas, 2024.