Luiz Otávio Oliani nasceu no Rio de Janeiro. É professor e escritor. Publicou 18 livros até o momento, além de participar de mais de 200 livros coletivos nacionais e estrangeiros como poeta, cronista, contista, autor de prefácios, orelhas ou resenhas críticas. Consta em mais de 600 jornais, revistas e alternativos. Tem textos traduzidos para inglês, francês, italiano, alemão, espanhol, holandês e chinês.
HERANÇA
não deixo bens
aos que ficam
de mim
restará a palavra
(antes cinzel)
agora verso
a burilar os homens
AVENIDA PAÍS
em sonolência
de cinco séculos
o ‘impávido colosso’
sobrevive
ante as guerras
mudanças de sistema
leis que se fazem velhas
o gigante abre os olhos
e a juventude hi-fi
smartphone facebook?
onde brado retumbante?
ESBOÇO SOCIAL
“Os fantasmas têm que existir”
Adalberto Marques
fantasmas
habitam pessoas
cegas surdas mancas
não ouvem a fome alheia
não tateiam a dor dos miseráveis
não enxergam o coração dos desvalidos
a sociedade se compadece
de ter e não de ser
defeca arrogância
ri de si mesma
se julga superior
esquece que
os espelhos
ainda existem
METEORITO
“O eterno é que me veste”
Astrid Cabral
não planejo escrever um verso
ele vem até mim
e explode em linguagem
domesticado
não fujo da sina
se o poeta é
imerso no coletivo,
como usar o verbo
sem que represente
a si próprio?
mesmo assim
escrevo
escrevo
não para ser eterno
nem alcançar glórias
escrevo
porque sou instrumento
da palavra que Deus sopra
em meus ouvidos
EM PARTES
A Yone Rodrigues
além de mim
nada
eu sou o tempo
eu me invento
quebra-cabeça
sou o que não pareço
se ando para trás
se rastejo
se voo
tem vezes
que não me conheço
quebrado
o espelho
não me reflete
meio bicho
meio poeta
em partes
em migalhas
em pedaços
eu sou o tempo
eu me invento
EM NÓS
o que há em nós
é a espera
que não finda
o que há em nós
é o desejo
de ver no outro
o que nos falta
o que há em nós
é a espera do porvir
que nunca chega
o que há em nós
é a fome
que não sacia
DESATINO
dentro de mim
uma caixa de sapatos
meia dúzia de pipas
um gibi
meu pai virou rio
deixou inventário
o que ficou
além da herança?
Trackbacks/Pingbacks