Suffit Kitab Akenat nasceu em 1905, em Tesseney, na fronteira entre Axum e a Eritreia. Poeta, escritora, pensadora e ativista, tem uma produção multicultural a partir de suas próprias experiências de vida. Iniciou sua poética influenciada pelo islamismo, mas, a partir da década de 30, quando viveu em Paris e Londres, passou a apresentar outros temas, principalmente políticos e sociais, denominados “Ideocrítica”. Faleceu  em 1987.

Introdução à Ideocrítica
(Premissas)

A ideologia é a falsa consciência de um fato.

Um fato é um acontecimento empírico
que se pensa ser verificado.

A consciência é o pensamento que descreve
uma situação (que depende de um contexto).

A situação é o conjunto de de elementos sociais
e físicos em que emerge o individual.

O contexto é a condição material que cria
a situação que engendra o fato.

A condição é o estado objetivo
de desenvolvimento da energia social e material.

O estado é o ser em movimento
captado em um dado estádio.

A objetividade é a impossibilidade
de falsear a consciência.

A falsidade é a inversão do valor de um fato.

O valor é a dimensão atribuída
pela consciência a um fato.

Toda a possibilidade é força pronta a tornar-se ato.

O pensamento é a linguagem em processo.

A linguagem é a organização de sinais
que permite a ação.

A ação é o movimento que organiza o fato.

O movimento é a energia incomensurável
concentrada na ação.

A energia é a força dos sinais que indiciam
a ideologia.

A ideologia é energia individual e força social.

*

Um nó enlaça a garganta
Como se alguém perguntasse por mim
Ao cimo das escadas dentro de uma caixa imóvel.
Algo
Um soluço de criança incontrolável
Um ligeira brisa da montanha
Adejando os véus translúcidos
Ou até um efêmero rumor marinho
Quase imperceptível
Longe da multidão atônita.

*

Estamos ainda no princípio da tarde calma
Descobrindo a ânfora da morte.
Os cavalos passeiam à rédea curta
Sobre flocos de areia.
A paisagem difere dos textos
Mas não é nefasta.
Entre a água e as nuvens
Uma águia solar e vesperal
Projeta-se na acidez do écran.
Seduz a velocidade desse instante.

*

Anoitece lenta e apaixonadamente
No harmonioso bosque conjugal.
Espreito pela fresta de vimes hirtos
E agüento a lucidez entre dentes.
Quando a água suja dos limos
Se desata das grutas íngremes
Avanço incendiada pelos diamantes azuis
E a saliva obscurece a gordura das palavras.

*

A rapariga ardente e compenetrada
Com o rosto à deriva
Acena para o que toma chama inglês.
As palavras associam líricas açucenas e jasmins
À lenta e meticulosa erupção do sexo.
Vogando entre delírios obscenos
Uma flâmula de vidro transparente incendeia
Os cristais da voz.
Com o rigor do astrônomo
O vento agita canaviais e o bosque aqui tão longe
E parte à desfilada deslizando.
Ó ligeira ondulação que faz tremer
A escrita!

*
Se não sabes ler
Pensamentos dos que falam
Não fales de ouvir

*
Doenças fatais
São hábitos e pertences
Que não desprezamos

*

Educar é fácil
Se treinares teu filhinho
Para te educar

*

Se o corpo explodir
Temos arte ou atentado
conforme a explosão


*Poemas do livro “Máximas Mínimas e outros textos”, Landy editora, 2003.

Traduções de Juliana de Sousa Lobo e Pires.