Lucas Guimaraens nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais, em 1979. Fruto de uma das mais importantes famílias poéticas do país, os “Guimaraens”, tem como ancestrais Bernardo Guimarães, Alphonsus de Guimaraens, Alphonsus de Guimaraens Filho e Afonso Henriques Neto. Além de poeta, é produtor cultural, diretor de relações institucionais, bacharel em Direito no Brasil e mestre e Ph.D em Filosofia Política e Estética em Paris, França. Defensor do amplo acesso à leitura em Minas Gerais, desde 2016 é coordenador do Plano Estadual do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas – que visa a garantir o acesso aos livros e a formalizar políticas públicas de fomento e democratização da leitura no estado.

silêncio

pousar de mundos destroçados e perfeitos
aranhas carregam entre pinças fios
de palha da órfã andorinha

sapatos já não servem na garganta
de medos e amores invisíveis
braços não alcançam cordas do balanço
ou a faca do almoço diário

momentos de gotas de chuva virarem mãos
e despejarem perfumes & veludo
nas paredes das peles curtidas das noites

minimalista

diariamente
café ralo
ponto de ônibus
(a espera sem saber)

quilômetros até
a construção
ou repartição
capacete
ou computador
britadeira
ou grito

noite
solidão
sertanejo
um tomate com sal
(sem saber se)

diariamente
um tijolo
ou viga
ou aço
ou vidro
ou queda
(sem)

sequer
imaginava
dançar
música
minimalista

dois homens mortos

somos dois homens mortos
costurando a noite
em caminhos retalhados
de navalha e contas a pagar

somos dois homens mortos
pulando pixels
em telas de computador
de construir navios & fantasmas

somos dois homens mortos
e não sabemos da vida mais
do que tragédias póstumas

(manuel, os filhos que nunca tive
inalam o cheiro de chernobyl em
máscaras de oxigênio
debaixo de escombros?)

somos dois homens mortos
ou duas mulheres mortas
ou duas crianças mortas
e nossos olhos brilham
poeiras de esperança

osso

aviões rorejam rachaduras no céu.

barcos afastam da margem
outras margens – estendem o fim.

tecno ou clássico
o homem no lago das incertezas
comunica nos percursos
brilhos das estrelas.

o osso é a última reminiscência
das vagas lunares.
retinas de cigarro e luz.

feridas e sonhos remanejam o invisível.

pausa-momento

andar pelas mesmas tábuas
bom dia ao avesso um
copo à mão
vento passa pelos cabelos
cada vez menos
assovio da janela que não se sabe fechada
dança de cata-ventos imaginados
sonhadas definições das coisas.

*poemas do livro “exílio – o lago das incertezas”, Editora Relicário, 2017.