Glauber de Andrade Rocha nasceu em Vitória da Conquista, Bahia, a 14 de março de 1939. Considerado um dos principais nomes da história do cinema brasileiro, sendo um dos fundadores do movimento “Cinema Novo”, produziu filmes clássicos como “Deus e o Diabo Na Terra do Sol” e “Terra em Transe”. Também foi poeta, apesar de ter sua obra literária ainda pouco conhecida.
Reverenciado como um gênio revolucionário, visionário e intelectual, sua poesia também obedece sua alma inquieta e questionadora. Utiliza linguagem moderna, repleta de neologismos e formas concretas, trazendo temas políticos, sociais e críticos sobre a própria cultura brasileira.
Glauber Rocha faleceu no Rio de Janeiro, no dia 22 de agosto de 1981.
Carta
Devo abandonar este país.
Ontem, na praia, vi um navio inaugurar, ao longo, a linha
da ocupação.
O verão chegou e com ele uma nova Constituição:
O Alto Poeta Drummond protestou contra o corte da
palavra Cultura no Parágrafo referente à Educação.
Educação sem Cultura não pode!
O Presidente eleito viajou por 50 dias para ver o mundo
exterior e de lá trazer fórmulas para salvar a Nação.
Técnica, Economia e Feijão!
Há necessidade de uma ricerca sociológica. Poderia dizer
pesquisa mas tudo fica na mesma. Em 1922 Mario de
Andrade e outro Osvald, também Andrade, falaram de
antro&pó&Fás indigenas e outras bossas esquecidas até que
outras, mais novas e vivas, por aqui surgiram, no território
de Ipanema. A poesia ficou concreta – o país in Cultura!
Introduziu-se Kafka, Joyce, Pound e até mesmo Píndaro –
falou-se de Einstein, Maiakovski e Gomringer, injeções de
inteligentes! Sartre virou comunista!
O melhor verso é desegragação.
Juscelino Kubistcsheck desaliena os poros de uma geração!
O Nacionalismo não é verde-amarelo!
O país é subdesenvolvido!
Do concretismo ao proselitismo!
Nas praças se prega a revolução!
Quem é gente vive como bicho!
Abre-se um Banco de agitação!
Vieram os militares, deram um Golpe!
Kapital Song
O passaro sagrado é velho feio
. doente e fraco
O passaro sagrado que vive
. dentro de um ouro no alto da
. árvore que entra nas nuvens
Com as penas da coroa deste pássaro
se faz a coroa da eternidade
Passaro
Este passaro atrai Cocteau. Aguia de
2 cabeças.
Claras
Esclareci varios enigmas de mil dias
adormeço refletindo lentamente
Veredas abreflecham
o ferrugem detergente do cerebro escravo
raiz do mel incendiada na fronte.
Galos
cantar galos auroras moventes
galos de lorca galos de luz
galo pedrês galos gullar
galo de festa galo caribe
galos daqueles carajos dourados
galo espora galo esporra
galo terreiro na rinha feroz
galos galinhas na boca do dia
cantando brigam galos de guerra.
Mestre de Minas
No compasso de Drummond me aprendo
Removendo pedras em Roma
Subo escadas
Tropeço
Telefono necessidades
Dou
Peço
Outros continentes me esperam
Há tempo para plantar colher
Anarquizar pelo tesão inesperado
Cair
Erguer
O tempo é pouco pra tamanha paixão
A máquina do mundo não me pega
Ganhei perdi meu dia
Despedi sorrindo a velha agonia.
Letra Fera
que pretendo com o texto?
não me de texto
não te de texto
não te con texto
não te pro texto
detexto tetexto contexto protexto
proxeneta!
que saia dos meus dedos neste delírio vero
cascatas literarias geladas
tenho a boca quente o inconsciente estropiado
a pior sensação de vida até hoje embora feliz com
juliete paloma vida cinema dinheiro projetos
política incerta todavia sofrimento de cinco dias vomitando
em hotéis de luxo na Sicília em Palacios romanos
fumando hervas derivadas e planando
no silêncio de um sábado veraneio sem brilhantismo
além da paz que convive com angustia do prazer a
espaguenoia tediosa
terrias sola mia privada litra poesia
vou dou vos respondo ès privada nao vos ilumina
a letra latrina do meu umbigo polveroso
Cosmerespermadoecaotical
Então se você fode ou se masturba sentira sensação a
intransferível deste
aparato literario…
das belas letras complacentes
corredores das universidades eletronicas
que pretendo com o texto?
não me de texto
não te de texto
não te con texto
não te pro texto
detexto tetexto contexto protexto
proxeneta!
Tristeza
Este último poema
é o desespero
E não modifica a História.
Milagros não veio
Sofro e escrevo
Esta tarde se fudeu
Sofro e escrevo
Morri uma tarde
Aos 35 anos
Milagros não veio
Morri uma tarde
A noite será maior
Sem você meu amor
Eu morro de solidão
Raizes
Vou dormir
Um poema síntese
Boa noite
Vou sonhar
Um homem de 34 anos
Sua história segundo sua classe
Criatividades subterraneas
Variações em torno do óbvio
Na presente condição.
No futuro redenção
Cada momento sem amor é mortal.
Arte perfeita sai do sexo
Vida
Nada mais estetico que produzir homens
Pare o homem ideal
Ó mãe natura
Pai modelador da sociedade capitalista.
1922
meu povo é triste
de pau perado
é um povo mole
de zés perado
meu povo é doce
malandro sensual
é um povo gostoso
dançarino musical
meu povo é mestiço
linguarudo fofoqueiro
é um povo inteligente
ignorante e condoreiro
meu povo é grande
no litoral e sertão
é um povo ah meu povo
é povo revolução
*
Trepar sem vexame
Fazer carinho no teu umbigo
Pedir
Dar
Ser
igual
legal
Estou tocando meu amor
Por favor me deixentrar
Não me faça feijoada
Não lave não limpa
Me deixentrar
*Poemas do livro “Poemas Eskolhydos de Glauber Rocha”, Editota Alhambra, 1989.