Flora Maria Loureiro Figueiredo nasceu em São Paulo, em 1951. Poeta, cronista, tradutora, compositora, foi vice-presidente da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil, membro da Women Association of Journalists and Writers, correspondente do Centre International d´Études Poétiques, na Bélgica, de cujo acervo constam suas obras. Durante três anos foi responsável pela última página da Revista Cláudia. Finalista do Prêmio Jabuti em 2000 na categoria Poesia, é membro da União Brasileira de escritores (UBE). A autora publicou as obras poéticas: Florescência (também lançado em Portugal), Limão Rosa, Amor a Céu Aberto, Estações, O Trem que Traz a Noite, Chão de Vento e participou de várias Antologias. Seus livros foram adotados pelas redes públicas de ensino. Tem trabalhos nas áreas publicitária e musical, com parceiros como Ivan Lins, Natan Marques, maestro Aylton Escobar e vários outros.

FORMAS

O amor é um movimento
circular.
Duas pontas que se acham,
se encaixam de tal modo
que começam e terminam
no mesmo lugar.
Milimetricamente se afinam.
Giram juntas
vivências abaixo,
delírios acima
a rodar um enredo
sem perguntas.
Sustentam a base da bola,
felizes e adesivas;
quando ela rola, se agarram,
quando ela para, se estendem
sempre atadas,
atentas e cativas.
Só que às vezes, na descida,
numa pedra errada
de um cainho denso,
a roda fica contundida,
já ovalada então
e com seu centro peso,
ela fica agora desigual.
Cada ponta se destaca
e distancia:
oposição plena e fatal
de uma reta perfeita
da mais insatisfeita geometria.

FALHA NOSSA

Quando Deus criou a emoção,
Ele a fez natural e equilibrada
de forma tal,
que a lágrima veio então dosada
nas justas proporções
do açúcar e do sal.
Foi o homem que a tornou exacerbada
e conflitante.
É que Deus num momento descuidado
ficou entusiasmado:
inventou o poeta e o amante.

LÚDICO

Acho que me esqueci dentro de você
naquele abraço.
Venho tentando respirar,
não posso;
quando quero sorrir,
me frustro;
se preciso ne mover,
fracasso;
e mais me assusto
se procuro meu reflexo
que treme fraturado
sem motivo justo
e olha-me perplexo.
Se você me devolver pra mim,
eu lhe concedo
aquele seu prazer desatinado
que mantenho comigo controlado,
a se enrolar na ponta do meu dedo.

ALÇAPÃO

Não era nada disso.
Queria para o nosso cortiço
um teto vedado,
composto,
completo,
Sem buraco no zinco
a pingar tristeza
ao nosso lado.
Com piso,
com trinco,
com toalha na mesa.
Mas o lar destelhado
me faz companheira
das sombras da rua.
A contragosto me reparto inteira:
uma parte é dela,
outra parte é sua.

*Poemas do livro “Calçada de Verão”, Editora Nova Fronteira, 1989.