Gonçalo Manuel de Albuquerque Tavares, mais conhecido como Gonçalo M. Tavares, nasceu em agosto de 1970, na cidade de Luanda, Angola. Um dos escritores portugueses mais premiados da atualidade, foi visto por nomes como José Saramago, como futuro Nobel de Literatura. A 9 de Junho de 2012 foi feito Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

Com seu primeiro livro publicado em 2001, Gonçalo M. Tavares, é autor de uma vasta obra que está a ser traduzida  num total de 70 países. A sua linguagem apresenta uma ruptura com as tradições líricas portuguesas e a subversão dos gêneros literários fazem dele um dos mais inovadores escritores europeus. Em 2021, recebeu o Prix Laure-Bataillon 2021, atribuído ao melhor livro traduzido em França. Foi seis vezes finalista do prémio Oceanos, tendo sido premiado três vezes. Foi ainda duas vezes finalista do Prix Médicis e duas vezes finalista do Prix Femina, entre outras distinções de relevo como o Prix du Meilleur Livre Étranger em 2010.

46.

Toda a saúde é ciência.
A arte é doença. Rápida; aflige, mas incita à vontade:
mudar de vida, hoje!
Não é cão Rápido.
É o cão coxo que se perdeu no Atalho Sublime. E este,
sim, o percurso, é VELOZ.
Suicídio sem sangue, suicídio por dentro.
Mudas a vida e o caminho; mudar o Coração.
Depois da Arte o coração a Zero.
Vou de novo, claro, mas com pés no Branco. Assim.

24.

Deus não é cansado.
Cansado é pernas que podem andar, sentadas na cadeira.
Deus é pedra.
Não há cadeiras nem PERNAS.

15.

geografia pesada: pedra.
geografia leve: AR.
geografia de Peso intermédio: Corpo.
geografia exaustiva: deus.
(Deus não dá ESPAÇO ao Espaço)
Deus recusa o INTERVALO
Deus não tem Intervalos.

1.

Toda a ligação é acrescento.
Ser mais é ser mais do que ser igual, e é ser muito mais
do que ser menos.
Ser mais é mudar de sítio.
Toda a ligação é, pois, mudar de sítio. Ou seja: de coração.
Ou seja: de ALMA. Ou seja: é Preciso Fugir à Grande
IMOBILIDADE, a Morte; o coração inapaixonado.
Síntese: o Coração quando não ama, morre-se dos ossos.
Invenção Urgente: o coração em FORMA e Matéria de osso.
Coração ossificado.
Por exemplo: ele, homem, tem as Artérias que dão para
as Mulheres em gesso Puro; ninguém se mexe nessa sala
já por si apertada.
Toda a Des-ligação é suicídio.
Cada carta não enviada é Desastre. Uma queda.
Até os Mortos esperam notícias, quanto MAIS.
Toda ligação é sobreviver.
E até o Morto sobrevive. Liga-se ao que não se vê;
ao que nos vê.
Porque eu sou invisível da Minha Morte. Hoje, já, neste
MOMENTO.
Tudo o que fica é IGNORÂNCIA.
Não ser igual ao FUTURO; é isto o IGNORANTE geral,
total; a base do desespero Branco dos vivos estúpidos,
todos vivos. O Morto é contemporâneo do Futuro,
parece-me a evidência.

11.

A grande Inteligência é sobreviver.
As tartarugas portanto não são teimosas nem lentas,
dominam, SIM, a ciência.
Toda a tecnologia é quase inútil e estúpida,
porque o artesanal tartaruga,
a espontânea TARTARUGA,
permanece sobre a terra mais anos que o homem.
Portanto,
como a grande inteligência é sobreviver,
a tartaruga é Filósofa e Laboratório,
e o Homem que já foi Rei da criação
não passa, afinal, de um crustáceo FALSO,
um lavagante pedante;
um animal de cabeça dura. Ponto.

5.

O exterior não existe.
Tudo o que se vê é o nosso quarto íntimo.
(escreve Novalis:
“O exterior é um interior elevado em estado de mistério.”)

54.

A convicção cão cão.
Os dentes nas ideias. Não largar.
Isto, a Filosofia. A poética não.
Não é convicção cão; é convicção e queda. (poética)
O ENTUSIASMO é Máximo até ao Ponto em que é
Mínimo.
Depois, ai, o SALTO!
A convicção-cão não larga. FILOSOFIA.
A poética é diferente: Bicadas e voo.
O alimento necessário para a FORÇA VERTICAL,
mas não o excessivo: aquele onde o Peso é maior que a
altura.
Imaginar é o estômago que sobrevive; não é cheio,
saciado.
Aí, na Redondez, no Redondo, como sair do chão?
A montanha tem Estômago cheio.
O ALTO AR tem o Transparente no Centro.
Alimenta-se de Saltos ALTOS, PARA CIMA. Para o Topo.

*Poemas do livro “Investigações. Novalis”, editora Chão da Feira, 2020.