Li Bai, também chamado de Li Po ou Li Bo, nasceu em  701, em Suiabe (antiga cidade da Rota da Seda), localizada no hodierno Quirguistão. Um dos maiores poetas da literatura chineses durante a dinastia Tang, era apelidado de “Poeta Imortal”, tendo aproximadamente mil poemas documentados. Traduzido e estudado mundialmente por nomes como Ezra Pound, Marie-Jean-Léon e Cecília Meireles , sua obra exerce grande reconhecimento no Ocidente.

Citado por Ezra Pound no livro “ABC da Literatura”, como “o maior exemplo da visualidade da poesia chinesa”, a obra poética de Li Bai tem por característica a imaginação visual. Seus poemas apresentam representações inusitadas e uma influência taoista, ao mesmo tempo que por suas loas ao vinho e à música como veículos de alegria e/ou transformação da percepção sensorial, é apontado como um dos mais líricos poetas chineses.

Li Bai teria falecido em 762, aos 61 anos. Segundo uma lenda, ele teria morrido afogado no rio Yangzi quando caiu de seu bote ao tentar abraçar o reflexo da Lua, estando sob os efeitos do álcool.

NO MONTE TONG

Passaria cem anos nesta montanha
sem pensar no regresso. Cem anos de embriaguez
Gostaria de dançar e com as minhas mangas
roçar todas as copas dos pinheiros de uma só vez.

UMA NOITE ENTRE AMIGOS

Para esquecer a eterna tristeza do mundo
nada melhor do que ficar a beber
A noite convida-nos a conversar
A lua    tão clara    não nos deixa adormecer
Bebamos e cantemos entretanto
Quando cairmos de bêbados
A montanha será o nosso leito e o céu o nosso manto

COM UMA TAÇA DE VINHO NA MÃO

Estava a beber e nem me dei conta
de que entretanto a lua apareceu no céu
Ela no seu curso não para de nos seguir
mas nós    mesmo que quiséssemos    não a conseguiríamos agarra
Lua resplandecente como um espelho suspenso
de uma janela com cortinas cor-de-rosa
As nuvens azuis acabam por se desvanecer
mas ela conserva sempre o seu brilho
Nós não podemos contemplar a lua de antigamente
mas a lua iluminou todos os homens – os de hoje e os de outrora
Gerações e gerações arrastadas pela corrente
Todas elas se renderam igual modo à sua beleza
Neste momento em que se canta e se bebe       o que o meu coração anseia
é que       no fundo da minha taça de oiro         se reflita a lua cheia

O DESTERRADO

Os dias e os séculos são sempre assim fugazes
O céu azul prolonga-se pelo infinito
Não acaba mais esta incessante luta contra o tempo
A Rainha dos Imortais tem a cabeça engalanada
mas nela abundam já os cabelos de neve
O Rei do Céu ao ver as Virgens de jade
ri às gargalhadas      mil dez mil vezes
Eu tento atrelar os dragões ao meu carro solitário
para subir ao Oriente
Convidá-los-ei a beber na Ursa Maior
essa imensa taça um vinho especial
Não pretendo honras nem riquezas
só que não me abandone a primavera

BEBENDO O LUAR

Ergo entre as flores um copo de vinho
e convido o luar
Acabo também por convidar
a minha sombra
Mas a lua não sabe beber
e a minha sombra não me consegue acompanhar
Companheiros de um instante
– a lua      a minha sombra e eu – vamos brindar
à primavera.
Enquanto canto      a lua vagueia
Enquanto danço     a minha sombra desespera
Esqueçamos tudo enquanto estivermos a beber
Que cada um se afaste
quando o dia chegar
Na longínqua Via Láctea
mais cedo ou mais tarde
nos voltaremos a encontrar

A ESTRELA DO VINHO

Se ao céu e à terra fosse indiferente
Não haveria no céu a estrela do vinho
nem o vinho brotaria de uma nascente
Amá-lo é pois digno dos deuses

Incomparáveis as virtudes do vinho
Puro ou terno como os homens e o seu coração
Com três copos conquistamos a felicidade
Mais três copos: temos o universo na mão

BÊBEDO NA PRIMAVERA

Se a vida não passa de um sonho
que sentido faz esta inquietação?
Bebo sem parar. Cambaleante
acabo por adormecer no chão

Acordo com os primeiros raios de sol
Oculto entre as flores canta um verdilhão
Quem a não ser o vento da primavera
lhe poderia inquietar o coração?

Recomeço a beber. E a cantar
Uma canção     um copo. Um corpo    uma canção
Até perder de novo
toda e qualquer sensação

*Poemas do livro “O Vinho e as Rosas – Antologia de Poemas sobre a Embriaguez”, Editora Assírio & Alvim, 1995.
Organização de Jorge Sousa Braga