Entrevista com escritor e roteirista Fernando Drummond

Primo de Carlos Drummond de Andrade, Fernando Drummond é um dos novos best-sellers brasileiros

Fernando ao lado da estátua de Carlos Drummond, em Copacabana

Carioca, nascido no dia 24 de março de 1984, Fernando Drummond formou-se em direito, porém, carregando de berço um dos sobrenomes mais importantes da literatura brasileira, logo seguiu os caminhos da escrita. Primo de Carlos Drummond de Andrade, apesar de nunca ter tido contato direto com o poeta – falecido três anos depois, em 1987 – traz em seu DNA o dom de encantar os leitores. Não é à toa que virou best-seller já em seu primeiro livro, “Serial Killers – Trilogia do Mal Vol 1: Sombrio”, de 2016, com cerca de 20 mil publicações vendidas. Agora, no entanto, vive a angústia de ver a sua segunda obra, “O Desempregado do Amor”, de 2018, em censura prévia judicial.

Em uma aprazível conversa de mais de 3 horas, no aconchegante mezanino da livrara Prefácio, em Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro, ele nos contou, entre tantos assuntos, um pouco de sua vida na literatura, a ansiedade de ver o seu livro “livre” da censura, além do peso que ainda admite carregar por ser primo de Carlos Drummond de Andrade. Ele confidencia, inclusive, que para evitar comparações injustas, criou “bloqueios” para escrever poemas.

Neto de Moysés Pinto Drummond, primo de Carlos Drummond de Andrade, Fernando também é roteirista e “ghots writer” (“escritor-fantasma”), profissional que é contratado para escrever por alguém, sem receber o crédito pela autoria da obra. Sobre isso, ele diz não entender as razões dessa profissão não ser valorizada no Brasil:

“Só no Brasil ainda há essa imagem negativa do ghost writer. Tratam praticamente como um crime. Em todo mundo essa profissão é conceituada, valorizada. Eu não busco fama, eu busco ser lido. Se uma pessoa ler e eu conseguir ajudar alguém, eu estou vivo. Por isso é que tanto em meus próprios livros e roteiros, quanto nessas obras escritas sob demanda, eu sempre coloco a minha identidade e a minha essência. Disso eu não abro mão”, enfatiza.

Livro sob censura prévia: angústia para trabalhar com a nova obra

Mas, como em todo caminho sempre tem uma pedra, como dizia Carlos Drummond, nem tudo são flores na vida de Fernando.  Sucesso de vendas antes mesmo do seu lançamento oficial, “O Desempregado do Amor” sofreu  pré-censura por decisão, em caráter liminar, de um processo que está em segredo de justiça. Aconselhado a não falar muito sobre o episódio, enquanto a decisão judicial não sai, Fernando só não consegue esconder a frustração e a ansiedade de poder trabalhar com a sua obra: “Depois da boa repercussão do primeiro livro e a sua grande vendagem, todos me perguntam sobre o segundo. Isso é uma espera difícil. A ansiedade é muito grande, mas tenho certeza que logo isso vai passar”, resumiu-se.

“Os ombros que suportam o mundo”: Fernando e o peso de ser Drummond

O que para muitos seria uma grande porta de entrada para se apresentar ao meio literário, para Fernando, o fato de ser primo de Carlos Drummond de Andrade foi, inicialmente, um enorme peso para carregar nos ombros. Não por não gostar do primo, ao contrário, mas pelas constantes comparações que inevitavelmente teria que ouvir. Hoje, de acordo com escritor, essa responsabilidade se transformou em um delicioso desafio para melhorar cada vez mais os seus textos. Tanto que, agora em outubro, ele será “imortalizado” herdando a cadeira do primo na Federação Brasileira dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes.

“No início, ser primo de Carlos Drummond não era uma pedra no caminho, era um pedregulho! Um peso, convenhamos, ingrato de carregar. Hoje eu encaro como uma honra e vejo com muito orgulho. Carrego muitas coisas dele, principalmente o sentimento de acreditar que a gente pode mudar o mundo com aquilo que a gente escreve. Seja uma poesia ou qualquer outra coisa, escrever é a melhor maneira de fazer com que alguém te ouça”.

Fernando Drummond: “Ainda tenho bloqueios em escrever poesia”

No entanto, diferentemente de Carlos Drummond de Andrade, que é considerado o maior poeta brasileiro do século XX, Fernando ainda é avesso às composições poéticas. Ele admite sentir uma responsabilidade que ainda lhe cria um bloqueio para escrever poemas:

“Amo poesia, mas prefiro ler. Eu escrevi uns três ou quatro poemas na vida e nunca achei bons o bastante para divulgar ou continuar a escrever. Ainda tenho bloqueios em escrever poesias por causa das comparações. Quem sabe isso não vá passando naturalmente… Gosto muito da escrita poética”, disse Fernando, revelando o poema do seu primo que ele mais gosta:

“Drummond tem vários, foi um dos maiores poetas do Brasil e do mundo. Dizer um é difícil, mas se for para escolher, acho que o poema ‘O que Viveu Meia Hora’, que ele conta a história do seu filho Carlos Flávio, morto 30 minutos depois do nascimento, o mais forte e emblemático de todos. Acho que ele se inspirou muito nos poemas de Augusto dos Anjos para escrever a sua dor”, enfatiza.

“O que Viveu Meia Hora” (Carlos Drummond de Andrade)

Nascer para não viver
só para ocupar
estrito espaço numerado
ao sol-e-chuva
que meticulosamente vai delindo
o número
enquanto o nome vai-se autocorroendo
na terra, nos arquivos
na mente volúvel ou cansada
até que um dia
trilhões de milênios antes do juízo final
não reste em qualquer átomo
nada de uma hipótese de existência.

De Bukowski a Gabo: as influências de Fernando Drummond na literatura

Falar que Carlos Drummond de Andrade é a principal inspiração de Fernando Drummond é obviedade demais. Porém, as influências literárias do autor também possuem nomes de grande importância mundial. Segundo o escritor, Gabriel Garcia Marquez, Charles Bukowski e Clarice Lispector são suas fontes de leitura mais assíduas. Em relação a livros, “Amor Líquido”, de Zygmunt Bauman, vive em sua cabeceira: “Esse livro consegue mostrar tudo aquilo que estamos vivendo atualmente, principalmente em relação à fragilidade dos laços humanos. É um livro fantástico que abre a mente e permite uma profunda reflexão do nosso mundo”.

Sobre a sua maneira de escrever, Fernando Drummond acredita ter conseguido encontrar um jeito próprio de narrar histórias e expressar as suas reflexões: “Eu sempre quero chegar ao limite, entre a realidade e a ficção, para mostrar até onde o ser humano pode ser capaz de chegar. Quando escrevo, não sei a razão, passo sempre por três temas: espiritualismo (mais em relação às intolerâncias religiosas), crimes sexuais (estupro) e doenças mentais. Para isso, procuro sempre montar uma linha do tempo às histórias, enriquecendo sempre com muitas pesquisas”, finaliza.

Além dos livros, Fernando Drummond é autor dos seguintes roteiros:

– O Desempregado do Amor (Longa Metragem)
– O Desempregado do Amor (Série)
– Segue o Baile (Longa Metragem)
– Rainbow (Longa Metragem adaptado)
– Sunshine (Longa Metragem adaptado)
– O Ceifador de Almas (Longa Metragem adaptado)
– Caos (Série)
– A Vertiginosa Vida de Chiquinho Zanzibar (Longa Metragem adaptado)
– Amor em Tempos de Ódio (Longa Metragem)
– De Férias no Ex-pício (Longa Metragem)
– E se fosse Você? (Longa Metragem)
– Escalada ao Abismo (Longa Metragem adaptado)
– Somente Amor (Longa Metragem adaptado)

Prêmios recebidos por Fernando Drummond:

– Diploma de Mérito Cultural, Caneta de Ouro 2017;
– Filósofo Honorário;
– Qualidade de Ouro;
– Personalidade do Ano de 2018;
– Nomeação de “Comendador Defensor do Patrimônio Histórico e Cultural Brasileiro”;
– Destaque Cultural 2017;
– Embaixador da Paz (OMDDH)
– Medalha Machado de Assis, 105 anos.