Vicente García-Huidobro Fernandéz, nasceu a 10 de janeiro de 1893, em Santiago do Chile. Aclamado como um dos maiores poetas chilenos de todos os tempos, fez parte das principais vanguardas poéticas do século XX. Ficou conhecido internacionalmente como o criador do “Criacionismo”, participando do grupo “Cabaret Voltaire”, tornando-se grande influência para a formação lírica de poetas como Federico Garcia Lorca. Sua obra é tratada como das mais inovadoras da sua geração, inclusive sendo apontado como um dos precursores da poesia visual, em 1912. Faleceu no dia 2 de janeiro de 1948, em Cartagena, Chile.

ARTE POÉTICA

Que o verso seja como uma chave
que abra mil portas.
uma folha cai; algo passa voando;
o que os olhos fitem, criado seja,
e que a alma do ouvinte fique tremendo.

Inventa novos mundos e cuida de tua palavra;
o adjetivo quando não dá vida, mata.

Estamos no ciclo dos nervos.
o músculo pende,
como lembrança nos museus;
mas nem por isso temos menos força:
o vigor verdadeiro
reside na cabeça.

Por que cantais a rosa, ó Poetas?
Fazei-a florescer no poema;
Só para nós
vivem todas coisas sob o Sol.

O poeta é um pequeno Deus.

NO

O coração do pássaro
O coração que brilha no pássaro
O coração da noite
A noite do pássaro
O pássaro do coração da noite

Se a noite cantasse no pássaro
No pássaro esquecido no céu
O céu perdido na noite
Te diria o que há no coração que brilha no pássaro

A noite perdida no céu
O céu perdido no pássaro
O pássaro perdido no esquecimento do pássaro
A noite perdida na noite
O céu perdido no céu

Porém o coração é o coração do coração
E fala pela boca do coração

A MORTE QUE ALGUÉM ESPERA

A morte que alguém espera
A morte que alguém arreda
A morte que vai pelo caminho
A morte que vem taciturna
A morte que acende os castiçais
A morte que senta nas montanhas
A morte que abre a janela
A morte que apaga os faróis
A morte que aperta a garganta
A morte que fecha os rins
A morte que parte a cabeça
A morte que morde as entranhas
A morte que não sabe se deve cantar
A morte que alguém entreabre
A morte que alguém faz sorrir
A morte que alguém faz chorar

A morte que não pode viver sem nós

A morte que vem no galope do cavalo
A morte que chove em grandes estampidos

DE VER E PALPAR

O iceberg sereno como um imperador
Segue sua sina
Obedece cegamente às linhas de sua mão

AO OUVIDO DO TEMPO (FRAGMENTO)

Tenho grandes ânsias e vergonha de tudo
Como uma hora que para e pede pão
Como aquele que não pode dizer o que quer
Enterrado no fundo da raça

*Poema do livro “Vicente Huidobro e Manuel Bandeira”, Edição da Academia Brasileira de Letras, 2007.
Tradução de Carlos Nejar