Marcelo Mourão é nascido no Engenho de Dentro, Rio de Janeiro. Mestre e doutorando em Literatura Brasileira (UERJ), idealizou, produz e apresenta o sarau POLEM, iniciado em 2008. Criou o subgênero poético POEMEMES, que funde a expressão poética com a linguagem dos memes. Desde 2021, é o vice-presidente da União Brasileira de Escritores (UBE). Há textos seus publicados em várias antologias, periódicos literários, sites e revistas acadêmicas, do Rio e de outros estados brasileiros.

A CHAMA DA VELA
para Tanussi Cardoso

do pó ao barro
do barro ao vaso
que volta ao pó
como a cinza
que não torna
a ser cigarro

a gota vira poça
a poça vira riacho
as águas correm
escorrem num átimo
seguindo a lógica
de um deus tácito

do pó ao jarro
do jarro ao caco
que retorna ao pó
como a fruta
que caída não volta
a pertencer ao galho

o melhor da flecha é seu voo
e não a chegada ao alvo

*poema extraído do livro “O diário do camaleão”, editora Personal, 2009.


JAULA

guardados
fechados
trancados
a cinco ou sete chaves
dentro de casa
muros telas grades
lacrados
vidros e portas
tudo blindado
todos pedindo a deus
que aqui ou lá fora
ele sempre nos guarde

*poema extraído do livro “O diário do camaleão”, editora Personal, 2009.


ACIMA DO OLIMPO

já não sei o que é meu
o que é teu
o que pertence ao mundo

só sinto e sei
que sou eu
meu enigma mais profundo

quem sabe sou
um tipo de deus
que te ama acima de tudo

*poema extraído do livro “O diário do camaleão”, editora Personal, 2009.

EIS A QUESTÃO

Dizem que o aborto
é uma aberração,
um homicídio.
A masturbação, então,
seria um genocídio?

*poema extraído do livro “Máquina Mundi”, editora Oficina, 2016.

EGOTRIP

Mergulho fundo nas profundezas minhas.
Vasculho os cantos desse meu mundo oculto.
Sonho, enfim, encontrar as partes perdidas:
peças partidas num vasto quarto escuro.

Mergulho desnudo e busco minha flor
que na redoma sempre se protegeu.
Rosa fechada, nela o que fui e sou:
mutante constante me mantendo meu.

Mergulho com tudo na minha fumaça,
não quero dissipá-la, só digeri-la:
quem sabe esta mesma noite ainda traga
muito mais tesouros do que eu imagino?

*poema extraído do livro “Máquina Mundi”, editora Oficina, 2016.

Autorresgate

queimei velhas certezas
explodi antigos cárceres
abri por fim meus braços

mantenho comigo o vento
que é quem sustenta
o voo dos pássaros

*poema extraído do livro “Poememes”, publicado em 2021.