Ana Cristina Cesar
Ana Cristina Cruz Cesar nasceu no dia 2 de junho de 1952, em Niterói, Rio de Janeiro. Poeta, jornalista, tradutora e crítica literária, é considerada uma das mais talentosas escritoras brasileiras de todos os tempos, destacando-se na década de 1970 como figura principal da “geração mimeógrafo”, também conhecida como “Poesia Marginal”. Pelo reconhecimento de sua obra, em 2016, ela foi a autora homenageada da FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty).
A obra poética de Ana Cristina Cesar é tão intensa quanto foi a sua vida. Com poemas bem intimistas, mantendo uma linha tênue entre o ficcional e o autobiográfico, ela se destacava por um senso estético bem autoral, valorizando o coloquialismo, para abordar percepções “insólitas” do cotidiano. O existencialismo e muitas indagações ao tempo, também foram temas que permearam as reflexões da escritora.
A formação poética de Ana Cristina Cesar começa em 1969, aos 17 anos, quando vai para a Inglaterra por intercâmbio. Morando em Londres, ela se forma em “Teoria e Prática de Tradução Literária”, pela Universidade de Essex. Nesse período ela passa a se influenciar e traduzir as obras de Sylvia Plath, Emily Dickinson e Katherine Mansfield. De volta ao Brasil, começa a apresentar seus poemas em revistas e jornais alternativos. Os seus dois primeiros livros publicados, “Cenas de Abril” e “Correspondência Completa”, foram lançados de maneira independente, praticamente artesanal, dando início à geração mimeógrafo, junto a nomes como Paulo Leminski e Torquato Neto.
Na contramão da censura imposta pelo regime militar, Ana Cristina Cesar se torna voz presente junto à cultura marginal, também chamada de “Marginália”, ganhando destaque e muitos admiradores na literatura. Batendo de frente com a ditadura, os seus”versos sujos” de revolta não poupavam críticas ao conservadorismo da sociedade, incorporando aos seus poemas elementos que expressavam a falta de liberdade e a violência diária nas grandes cidades do país.
Porém, a personalidade artística da poeta escondia uma depressão profunda. Após os seus 30 anos, começou a viver de forma soturna e solitária. Após algumas tentativas, aos 31 anos, Ana Cristina Cesar cometeu suicídio, atirando-se pela janela do apartamento dos seus pais, no sétimo andar, em Copacabana. O que se sabe é que ela deixou para o seu melhor amigo, o poeta Armando Freitas Filho, a responsabilidade de cuidar postumamente das suas publicações.
Ana Cristina Cesar faleceu no dia 29 de outubro de 1983, no Rio de Janeiro. O acervo pessoal da autora está sob tutela do Instituto Moreira Salles.
Poemas de Ana Cristina Cesar:
Protuberância
Este sorriso que muitos chamam de boca É antes um chafariz, uma coisa louca Sou amativa antes de tudo Embora o mundo me condene Devo falar em nariz(as pontas rimam por dentro) Se nos determos amanhã Pelo menos não haverá necessidades frugais nos espreitando Quem me...
Que Deslize
Onde seus olhos estão as lupas desistem. O túnel corre, interminável pouco negro sem quebra de estações. Os passageiros nada adivinham. Deixam correr Não ficam negros Deslizam na borracha carinho discreto pelo cansaço que apenas se recosta contra a transparente...
Tenho uma Folha Branca
Tenho uma folha branca e limpa à minha espera: mudo convite tenho uma cama branca e limpa à minha espera: mudo convite tenho uma vida branca e limpa à minha espera.
Contagem Regressiva
Acreditei que se amasse de novo esqueceria outros pelo menos três a quatro rostos que amei Num delírio de arquivística organizei a memória em alfabetos como quem conta carneiros e amansa no entanto flanco aberto não esqueço e amo em ti os outros rostos
Soneto
Pergunto aqui se sou louca Quem quer saberá dizer Pergunto mais, se sou sã E ainda mais, se sou eu Que uso o viés pra amar E finjo fingir que finjo Adorar o fingimento Fingindo que sou fingida Pergunto aqui meus senhores quem é a loura donzela que se chama Ana...
Olho muito Tempo o Corpo de um Poema
Olho muito tempo o corpo de um poema até perder de vista o que não seja corpo e sentir separado dentre os dentes um filete de sangue nas gengivas.
Flores do Mais
Devagar escreva uma primeira letra escreva nas imediações construídas pelos furacões; devagar meça a primeira pássara bisonha que riscar o pano de boca aberto sobre os vendavais; devagar imponha o pulso que melhor souber sangrar sobre a faca das marés; devagar imprima...
Fagulha
Abri curiosa o céu. Assim, afastando de leve as cortinas. Eu queria entrar, coração ante coração, inteiriça ou pelo menos mover-me um pouco, com aquela parcimônia que caracterizava as agitações me chamando Eu queria até mesmo saber ver, e num movimento redondo como as...
Estou Atrás
do despojamento mais inteiro da simplicidade mais erma da palavra mais recém-nascida do inteiro mais despojado do ermo mais simples do nascimento a mais da palavra.
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- Waly Salomão
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- Cacaso
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